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Extrema direita mira políticos alemães

Lukas Hansen pv
9 de janeiro de 2020

Ameaçado por radicais de direita, prefeito de pequeno município na Saxônia renunciou ao cargo. Ele foi alvo de telefonemas, bilhetes e até suásticas em seu carro. Este é apenas um entre vários casos similares no país.

Imagem do conservador Walter Lübcke numa cadeira antes de uma cerimônia em memória ao político assassinado
Walter Lübcke, chefe do conselho administrativo do distrito de Kassel, foi executado com um tiro na cabeçaFoto: picture-alliance/dpa/Y. Walsdorf

Arnd Focke perdeu a paciência: por demasiadas vezes ele fora vítima de ameaças de extremistas de direita. Sua decisão: em 31 de dezembro, renunciou ao cargo de prefeito do município de Estorf, na Baixa Saxônia. "A decisão doeu, mas foi acertada", reafirma o político de 48 anos. Afinal de contas, ele esteve oito anos à frente da cidade de 1700 habitantes.

Ex-prefeito Arnd Focke renunciou ao cargo devido ao acúmulo das ameaçasFoto: picture-alliance/dpa/J. Stratenschulte

Ele, que há anos defende a ajuda a refugiados, era constantemente alvo de ataques de simpatizantes da extrema direita. Há algum tempo recebia "telefonemas ameaçadores", de vez em quando, "mas sempre achei que estava protegido".

Contudo a coisa não se parou nas chamadas telefônicas. Suásticas foram desenhadas em seu carro particular, Focke começou a encontrar bilhetes em sua caixa do correio: "Vamos colocar você e a Antifa [movimento de militância de esquerda] na câmara de gás", dizia um deles. "Passaram dos limites. Tornou-se pessoal e direto demais", conta Focke.

A renúncia do prefeito teve grande repercussão, pois o caso alimentou uma questão que vem sendo discutida há algum tempo na Alemanha: quão seguros estão os políticos locais, especialmente contra ataques de direita?

Os casos passados transmitem uma mensagem clara: em outubro de 2015, a política independente Henriette Reker – na época candidata, atualmente prefeita de Colônia – foi agredida em plena rua com uma faca de caça de 40 centímetros, ficando gravemente ferida no pescoço.

Perante o tribunal, o agressor Frank S. relatou que queria enviar um sinal contra a política de refugiados na quarta maior cidade da Alemanha. Alguns meses antes, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, tomara a decisão de deixar as fronteiras da Alemanha abertas, diante das notícias de que milhares de refugiados estavam a caminho de seu país e da Áustria.

Suástica na janela do carro de Arnd Focke, ex-prefeito de EstorfFoto: Arnd Focke

Outro ano, outro lugar, crime semelhante: em novembro de 2017, um homem de 56 anos atacou com uma faca de 30 centímetros de comprimento Andreas Hollstein, prefeito da cidade de Altena, localizada perto de Colônia. Ainda durante o ataque, o agressor alcoolizado teria reclamado de forma depreciativa da política simpática aos refugiados do prefeito.

Dois anos mais tarde, os ataques de extrema direita a políticos locais alemães atingem um novo patamar de violência: o chefe do conselho administrativo da cidade de Kassel, Walter Lübcke, foi executado em junho de 2019, em frente à própria casa, com um tiro na cabeça, a curta distância, de acordo com as investigações.

O suspeito Stephan E. citou como motivo do ataque as declarações de Lübcke durante a onda de migração de 2015, quando o político conservador se pronunciara abertamente contra o racismo e a islamofobia. Mais tarde o presumível assassino retirou sua confissão, e o processo ainda está em andamento.

"O problema está no seio da sociedade"

Simultaneamente à divulgação da renúncia de Focke, surgiu a notícia de que o prefeito de uma cidade na Renânia do Norte-Vestfália haveria solicitado uma licença de porte de arma – por enquanto, negada. O político em questão, que não teve seu nome revelado, também teve que encarar extremismo de direita e agitação popular em sua comunidade.

No início de 2020, o presidente da Federação Alemã de Cidades e Municípios (DStGB), Gerd Landsberger, observou que "infelizmente, a situação de ameaça não melhorou". A associação, que representa os interesses dos municípios alemães, entrevistou mais de mil prefeitos, um quarto dos quais já foram insultados ou ameaçados.

"A política federal vai abordar isso", garantiu Landsberger. Atualmente, há em todos os estados pessoas de contato, às quais os prefeitos podem denunciar as ameaças. A DStGB também quer que a perseguição e assédio (stalking) de políticos seja criminalmente punível.

Manifestações de organizações de extrema direita são regulares na Alemanha, assim como demonstrações contráriasFoto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS

O ex-prefeito de Estorf não atribui o problema à política: "Ela está impotente. O problema está no seio da nossa sociedade. Não nos erguemos mais em defesa mútua e contra o extremismo. Pode-se novamente dizer coisas que há cinco anos não se podia nem pensar." Isso se aplica tanto aos radicais de direita quanto aos de esquerda.

Mas de onde vem esse desdobramento? "Descuidamos da educação. É preciso transmitir às crianças e aos jovens que na Alemanha temos um passado que não pode ser repetido. Além disso, há muita gente insatisfeita e fácil de manipular", analisa Arnd Focke.

Organizações populistas de direita, como o partido Alternativa para a Alemanha (AfD), acabam por ser um forte meio de disseminação da ideologia ultradireitista, mas defini-las como origem dos ataques radicais é simplificar demais o problema,

O ex-prefeito diz depositar sua confiança nos órgãos de segurança estatal, que investigam sobre os desenhos de suásticas e as cartas. Ele não acha que o seu seja um caso isolado. Pelo contrário: Focke acredita que muitos políticos se retiraram da vida pública por causa de perseguições. Eles simplesmente não levaram seus casos a público.

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